Por: José Vieira
No seguimento dos artigos onde
falei e continuarei a falar sobre o jornalismo regional, temos que, sem sombra
de dúvida, dedicar um capítulo para falar da forma como os órgãos de comunicação
social regionais se formam e gerem, bem como também escamotear o que de facto
está mal e devia ser corrigido, no que concerne ao financiamento das empresas
que gerem os títulos de comunicação.
Primeiramente, temos de
entender que os órgãos de comunicação regionais, antes de o serem, em primeiro
lugar são empresas, ou outra qualquer forma jurídica fiscal, devidamente legal
e autorizada. Depois de devidamente constituído o veículo comercial e fiscal,
inicia-se o processo de registo junto à ERC, do novo órgão de comunicação
pretendido. Após a aprovação, pode-se iniciar o trabalho de comunicação, seja
em que formato for, através de texto, áudio, som, televisão, no online,
impresso, ou em ambos.
O problema começa após 6
meses, em que e por via da dimensão da maior parte dos órgãos de comunicação
regionais existentes, (arrisco dizer talvez mais de 80%), não existe capacidade
financeira para criar uma estrutura comercial que traga retorno para a empresa
detentora do título em atividade (salvo obviamente alguns títulos que o
conseguem, felizmente). A parca publicidade angariada depressa se esgota, e o
jornalismo regional não sendo apoiado estatalmente ou localmente, pelo trabalho
que faz, sendo a primeira linha de uma democracia sã (dizem os entendidos), na
minha opinião cada vez mais instável, não resta outra hipótese que é a de
começarem a criar buraco financeiro, fechando a atividade algum tempo depois,
ou mesmo emagrecerem o título para os serviços mínimos, ansiando que alguma
coisa vá mudar no futuro.
Isto, caros leitores e
colegas, advém da má regulação do setor por parte do estado, bem como de uma
política de apoios financeiros, quase em exclusivo para os órgãos nacionais, em
detrimento dos regionais. Aplaude-se o trabalho do jornalismo regional, no
levantamento de questões fundamentais, na divulgação do que de melhor se faz,
semanalmente, nos concelhos, mas depois não se criam mecanismos de apoio
financeiros. Pede-se que façamos gratuitamente este trabalho, sem pensarem que
existem custos e nem sempre a publicidade angariada cobre os custos de
exploração (ordenados, equipamento, rendas e gestão diária).
A publicidade nacional
privada, raramente baixa aos regionais, fruto de e mais uma vez, uma má
regulação do setor. Eu percebo que não caiba ao governo dizer às empresas que
tem de gastar determinado valor no jornalismo regional, pois sendo empresas
privadas, não se pode, de modo algum, condicionar a liberdade de escolha dos
veículos publicitários que usam para divulgar os seus produtos, mas o governo
também pode recusar determinadas adjudicações, mediante determinados
posicionamentos. Ou não? Conhecem o regulamento que obriga as rádios (públicas
ou privadas) a passarem uma determinada percentagem de música portuguesa, em
função da que não é? Neste caso, e a bem da música portuguesa, o governo impõe
esta condição. Porque não e em defesa do jornalismo regional, também impor-se
que as empresas que trabalhem para o estado (central ou local), e nos seus
orçamentos de marketing, terem de cativar uma verba para apoiar a imprensa
regional? É assim tão censurável? Penso que não e resolveria uma grande parte
dos problemas neste setor.
A somar ao problema de uma
prática já enraizada, de que raramente as marcas nacionais estão presentes nos
órgãos regionais, pelo menos com alguma expressão, é o próprio governo que não
dá o exemplo. O valor que cativa anualmente para adjudicar publicidade no setor
regional da comunicação, raramente tem uma execução que ultrapassa metade do
previsto, simplesmente porque os ministérios e as secretarias de estado
estão-se nas tintas. É mais confortável e rápido negociar com 4 ou 5 grupos que
detém 80% dos órgãos nacionais, a terem de construir uma plataforma que vise
trabalhar com o setor regional. O mais caricato é que a verba para o regional,
em larga medida, nada tem a ver com as verbas para o nacional (falo apenas de
publicidade, nada mais). Ou seja, se determinado ministério não gastar a verba
afeta ao setor regional, simplesmente essa verba não transita para outra
rúbrica, dando-se, no final do exercício, como não executada, figurando nas
contas do governo, na rúbrica da não execução orçamental, no final do ano.
Interpelando-se estes senhores dos ministérios, sobre a razão destes
procedimentos em relação ao setor regional, têm a devida lata de dizer que os
jornais regionais é que não se aproximam e não enviam propostas. Em 2022,2023,
2024 e 2025, tive o cuidado de contatar 8 ministérios e 4 secretarias de
estado, bem como 23 institutos públicos (fiz isto todos os anos), que dependem
do orçamento de estado, nomeadamente e no que concerne à rúbrica da
publicidade. Em 4 anos de contatos, em mais de 150 e-mails e 65 chamadas
feitas, o resultado foi ZERO. Nem uma adjudicação, nem um pedido de orçamento,
e a taxa de ausência de respostas por parte dos destinatários, ronda os 95%.
Com isto não digo que não
existam órgãos regionais que fazem adjudicações ao estado, mas são muito
poucos, contando-se pelos dedos. Nas adjudicações ao poder regional (quase em
exclusivo às câmaras), existe uma inversão de 180 graus. As câmaras continuam a
ser ainda o maior cliente da imprensa regional, embora, na minha opinião, terá
de se regular o acesso a essas adjudicações, no sentido de permitir uma maior
clareza que possa tornar mais independente a relação de certos órgãos com o
poder local. Mas isto dá outro artigo!
No governo anterior,
iniciou-se um trabalho com o ex-secretário de estado (agora Ministro) e mesmo
com o Ministro da tutela da altura (agora candidato à CM do Porto), e embora
não seja ainda a solução perfeita, é um começo. Mas como já referi em artigo anterior,
receio que esse trabalho seja para meter na gaveta, se o setor regional não se
mexer, organizar-se e começar a fazer algum barulho.
Tem de se perceber que ao
governo em exercício (qualquer um), não interessa reforçar os poderes dos
jornalistas. Governos caem e são eleitos em Portugal e no mundo, muito devido à
ação de um verdadeiro jornalismo independente, que denuncia o que mal está e
consequentemente faz cair secretários de estados, ministros e governos. Como os
governos não podem tocar nos nacionais, exercem uma espécie de vingança nos
regionais. Vão dando umas migalhas de vez em quando (e às vezes uns doces), mas
o verdadeiro manjar dos deuses é sempre para os mesmos.
Há que rapidamente alterar
esta política. Nos últimos 20 anos fecharam mais de metade dos títulos
regionais e neste momento mais de 80% do que existe ainda em atividade
encontra-se com grandes dificuldades de solvência.
Há que fazer um trabalho
urgente de sensibilização da opinião pública. Somente com quem nos lê, vê e
ouve, podemos ter força. Quem nos lê, vê
e ouve diariamente, são os que votam, são os que têm opinião na sociedade e são
aqueles que serão a nossa força futura. Há que os trazer para o problema,
explicar o que está mal e fazer dessas pessoas parte da solução.
Por outro lado, temos de unir
o setor, identificar os pontos fracos, apresentar propostas e traçar
estratégias. Basta de falarmos para dentro e muitas vezes entre os dentes, com
a boca meio fechada.
No nosso setor, infelizmente,
também temos indivíduos que não prestam, que se vendem ao poder em troca de
algumas benesses exclusivas, para que paralisem o nosso setor e incrementem uma
política de demagogia estruturada, adiando dessa forma posicionamentos que há
muito deveriam estar no terreno. Esses indivíduos têm de ser também postos fora
das estruturas associativas, denunciados e se for caso disso processados
judicialmente. O setor do jornalismo regional tem de se purgar para renascer.
Somos muito pequenos
separados, mas muito fortes juntos.
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