Poetas e lobos em capítulo de
final feliz
Em dia de eleições para o
parlamento comunitário, os cidadãos europeus presentes no 26.º Portugal de
Lés-a-Lés foram os grandes ganhadores desta aventura que começou em Portimão.
Uma vitória esmagadora que valeu maioria absoluta no capítulo da diversão como
no gozo na condução, do usufruto das paisagens aos locais visitados.
Na última jornada, que ligou a
Covilhã a Penafiel, ao longo de pouco menos de 400 quilómetros, ficam na
memória as receções fabulosas com que foram brindados os participantes. Muitos
portugueses, mais de 1500, a que se juntaram espanhóis, suíços, belgas,
franceses, alemães, italianos, lituanos, brasileiros e indianos. Bafejados por
um clima ameno, sem o calor intenso ou as grandes chuvadas dos últimos anos.
Os sorrisos rasgados na
chegada ao último dos palanques, emoldurado por enorme multidão, foram a prova
mais evidente do estrondoso sucesso da aventura organizada Federação de
Motociclismo de Portugal. Mas o empenho exigido por mais de 11 horas de
condução também estava bem visível! Aliás, o aviso estava escarrapachado logo
na primeira das 20 páginas do ‘road-book’ da 3.ª etapa. Não deixava grande margem para
dúvidas e deveria ser levado muito a sério! Assim, como que cumprindo o dito
popular de que o ‘rabo é o pior de esfolar’,
o remate deste Lés-a-Lés obrigou a trabalhos forçados, num percurso lindíssimo,
mas praticamente sem uma reta para descansar os braços.

Arredondar pneu foi o lema do
último dia da maratona mototurística e os elementos da Comissão de Mototurismo
não deixaram créditos por mãos alheias. Desde bem cedo, logo na travessia do
mais imponente maciço montanhoso do território continental, a caravana começou
por abordar as curvas até aos 1500 metros de altitude da Nave de Santo António,
o ponto mais alto deste Lés-a-Lés.
Portugal
de Lés-a-Lés
Um até já aos Lobos da Neve,
recordando o local onde foram feitas as primeiras concentrações covilhanenses
antes ainda do nascimento do Moto Clube da Covilhã, no Sanatório dos
Ferroviários, criado para mitigar os efeitos da tuberculose nos trabalhadores
dos caminhos de ferro. Agora transformado em elegante e acolhedora Pousada que
viu os mototuristas passarem rumo a Manteigas, entrando num dos concelhos com a
floresta mais bem preservada em Portugal, onde não faltam teixos, castanheiros,
faias, plátanos, lariços-europeus e cedros-do-Oregon.

Para fugir à confusão gerada
pelas obras na N338, a conhecida estrada do Vale Glaciar, a opção passou por um
caminho não asfaltado, sem pó e com boa tração, obrigando apenas a velocidades
ligeiramente mais reduzidas, mas que permitiram apreciar mais serenamente
paisagens de cortar a respiração. A Estrela continua a surpreender mesmo
aqueles que por lá passaram muitas vezes, incluindo os que já conheciam a
espetacular cascata do Poço do Inferno. Onde as águas da ribeira de Leandres se
despenham numa queda de mais de 10 metros pelas corneanas, essas formações
rochosas criadas pelo contacto da água ao longo de milhares de anos. E cuja
beleza mais evidenciou a estreiteza do local, criando um engarrafamento digno
da hora de ponta de qualquer grande cidade.
O dia de
todos os lobos
Daí até Manteigas, foi um
instante para aproveitar a frescura do rio Zêzere, no Parque da Várzea, ainda
nos primeiros dos mais de 200 km quilómetros da sua caminhada até ao Tejo, onde
desagua próximo de Constância. É o segundo maior rio nascido em território português,
após o Mondego, curiosamente cruzado poucos quilómetros depois, e alimenta três
barragens de elevada produtividade energética. E onde um dos quatro totalistas,
com presença carimbada nas 26 edições, o ex-autarca de Lamego, Ângelo Moura,
fez um balanço sucinto, mas extremamente esclarecedor. “Esta foi a melhor edição da última década e, talvez, uma
das melhores de sempre. O percurso escolhido foi fabuloso e o tempo ajudou e
muito!”
Meteorologia que não podia ser
melhor para a prática da modalidade, com temperaturas a rondar os 20º C durante
o dia, ainda que ligeiramente mais frescas no arranque madrugador da Covilhã.
Com o Norte no horizonte, assinalou-se o regresso a uma estrada utilizada há 20
anos, no 5.º Lés-a-Lés, até Folgosinho, desfrutando das belezas da Serra da
Estrela antes da entrada no granítico planalto beirão via Fornos de Algodres.
Um sobe-e-desce numa estrada de asfalto a brilhar de novo e com mais paisagens
deslumbrantes, entrecortado pela despedida aos entusiastas elementos do MC Covilhã
Lobos da Neve. Que, para pastores experimentados, mostraram alguma falta de
jeito, tendo perdido o rebanho algures nas serranias…
Portugal
de Lés-a-Lés
Continuando envolvido por uma
paisagem de bucolismo reforçado por algum nevoeiro, entre verdejantes pastagens
e o cinzento granítico, o pelotão encontraria, logo de seguida, dois marcos
importantes desta tirada: a divertida Estrada das Beiras (N17) e, de novo, o
rio Mondego. Para, por entre aldeias briosas pontilhadas por casas de pedra de
aspeto senhorial, encontrar o mais rápido caminho para Aguiar da Beira. Vila de
grande imponência história, onde não faltam pelourinhos, torres ameadas ou a
torre do relógio além da igreja da Senhora da Lapa e a frincha entre dois
penedos onde só cabe quem não tenha cometido pecados. Que, acabou por não ser
visitada, obrigando a um ligeiro desvio que acabaria por ser aceite pelos
mototuristas. Afinal, o Oásis instalado em Moimenta da Beira, Capital da Maçã
de Montanha e terra de adoção de Aquilino Ribeiro.
Junto ao grupo escultórico que
homenageia o escritor nascido em Sernancelhe (Viseu) e que aos 10 anos foi
viver na aldeia moimentense de Soutosa, o pelotão foi surpreendido com uma
enorme festa mesmo em frente aos Paços do Concelho. Onde nem faltaram os grupos
de concertinas Vale do Távora e a Orquestra CemNotas para animar o grupo antes
da descida panorâmica para Tabuaço, descobrindo as primeiras vinhas da mais
antiga região demarcada vitivinícola do Mundo. E onde alguns motociclistas
ficaram presos pela passagem do pelotão de ciclismo profissional que por ali
disputava o Grande Prémio do Douro Internacional. Mas podem ficar contentes
porque protagonizaram uma verdadeira estreia. É que esta foi a primeira vez, em
26 anos sublinhe-se, que o Lés-a-Lés foi parado por uma corrida de bicicletas!
Escritores
e eleitores… em mobilidade
Com a grande aventura a
aproximar-se do final, tempo para novas serranias, com a descida até vale do
rio Távora, para o Oásis em Tabuaço. Onde mais música, desta feita com o grupo
de concertinas de Távora, animou o bailarico, rápido, mas intenso. Porque havia
que continuar a descida ao Pinhão, aproveitando apenas 3,4 km de N222 mas
exatamente no sítio mais interessante do ponto de vista paisagístico. E ali
registaram-se, sem grande surpresa, as temperaturas mais elevados do dia, ainda
assim com frescos 27.º C, bem longe dos 47, 5.º C que valem o recorde de
temperatura máxima em território nacional.
Portugal
de Lés-a-Lés
Mas o Portugal de Lés-a-Lés
não vive só de paisagens e trata de evidenciar o lado cultural do nosso País.
Assim, depois de José Saramago, em 2023, e de Aquilino Ribeiro em Moimenta da
Beira, viria ainda a homenagem a Miguel Torga. Na subida a Sabrosa, com paragem
no miradouro com o nome do autor, de onde é possível desfrutar de uma vista
excelente sobre a Foz do Pinhão, e logo de seguida em São Martinho de Anta,
terra do médico-escritor. E onde alguns participantes foram à Junta de
Freguesia para exercer o seu dever cívico, fazendo uso da possibilidade de voto
em mobilidade para as Eleições Europeias.
Rumo a novas serranias, a
caravana atravessou Vila Real, em passo de corrida, mas com tempo para
vislumbrar a montagem do famoso Circuito Internacional, que, no último fim de
semana de junho, recebe a 52ª edição das corridas de automóvel. Sem tempo a
perder, seguia-se a Serra do Alvão, onde o nevoeiro roubou alguma da
espetacularidade do Parque Natural, mas criou um ambiente místico patana
passagem por Lamas de Olo, ajudando a perceber o que são os lameiros, não
terrenos cheios de lama, mas sim prados irrigados com engenhosa rede de
distribuição de água para rega, impedindo a formação de gelo.
Procissões
e outras aventuras radicais
Mas o Portugal de Lés-a-Lés é
uma verdadeira caixinha de surpresas e os imprevistos, mesmo os bem organizados,
podem acontecer ao virar qualquer curva. Ou mesmo numa reta! Como ter a estrada
cortada por uma procissão dedicada a São Galo, organizada pela Comissão de
Festas dos Moto Galos de Barcelos, contando com a presença de sua Eminência, o
Bispo, e com música a condizer. Um espetáculo de imaginação e empenho dos moto
clubes que reforça o caráter único do Portugal de Lés-a-Lés, criando forte
animação onde menos se espera. E que, além de saciar o apetite os estômagos,
alimentam a alma com enorme animação.
A comida, essa estava mais à
frente, em Cavez, com Oásis montado nas margens do Tâmega, exatamente onde
desagua o a afluente ribeira de Moimenta. As bifanas e a prova de vinho verde
(só uma amostra, como convém a quem conduz!) reforçaram o ânimo para seguir
viagem pela excelente N205, rumo à Póvoa de Lanhoso ao extremo norte deste
Lés-a-Lés. Pelo meio, poucos foram os que repararam, à passagem por Rossas, num
dos mais antigos museus nacionais dedicados à história das duas rodas e que
merece uma visita.
Que ficou para próxima ocasião
porque, agora, estava marcada a visita ao fabuloso parque de atividades
radicais DiverLanhoso, espaço com 170 hectares de área e um ‘slide’ de 350 m.
Que ninguém pôde experimentar, até porque mais uma dose de adrenalina aos participantes
no Lés-a-Lés poderia deixar marcas…
Bombeiros
na festa do castelo e ajuda divina
Com Penafiel cada vez mais
perto, a passagem por Guimarães revelou outro momento alto desta edição do
Portugal de Lés-a-Lés. É que, se fora de casa Os Conquistadores fazem o que
fazem, com inesquecíveis controlos, era fácil adivinhar a dimensão da festa
dentro de portas. Uma simples fotografia com o castelo como pano de fundo foi
suficiente para montar uma enorme festa, com toda a corte real e um presidente
(Gaspar Marques) disfarçado de cavaleiro do reino.
Portugal
de Lés-a-Lés
Às fotografias e à música
acompanhada pelas damas da corte, juntou um camião-grua dos bombeiros, chamados
de urgência para salvar… um 'drone’. Obra e graça do cidadão brasileiro
Lucenildo Alexandre Azevedo que, a cumprir a estreia no evento, queria registar
tudo até ao mais ínfimo pormenor. Verdadeiramente eufórico, garantiu que vai
voltar “depois de legalizar a Triumph Tiger
1200 que trouxe do Brasil, em 2019”. Cuja matrícula dava bem nas
vistas, até pela raridade face às espanholas, francesas ou outras...
E que, tal como muitos dos
estrangeiros presentes, ficou espantado com receções como a que aconteceu em
Vizela. Onde descobriu o sabor do tradicional bolinhol, oferecido no jardim do
Parque das Termas, criado entre 1884 e 1886 e que possui uma quantidade de
árvores gigantes como nenhum outro parque ou jardim português. Verdadeiro
pulmão da cidade (desde 1998) que é Rainha Termal de Portugal, cujas termas
remontam ao tempo dos romanos e onde começou a ser feito o balanço de mais uma
presença no Portugal de Lés-a-Lés, pensando na chegada a Penafiel depois de
fazer tantas horas de condução como aquelas que dariam para chegar até à
capital Dinamarca, Copenhaga.
E, com a bênção da Senhora do
Sameiro, atravessar o palanque de chegada numa edição que cumpriu as promessas
de exigência, para motociclistas aventureiros e rijos, independentemente da
máquina utilizada. É que o Lés-a-Lés continua a ser uma aventura para todas as
motos, mas não para todos os motociclistas… A prova mais evidente é que os
participantes aproveitaram mais do que nunca, os serviços da equipa Osteomotus
para colocar os músculos no sítio e garantir uma viagem tranquila até casa. Que
só aí termina a grande aventura!
Fonte: Diário Online
(Colaboração especial do Gabinete de Imprensa Portugal de Lés-a-Lés)