domingo, 8 de setembro de 2024

“Além-fronteiras: Livro oferecido por Napoleão III a D. Pedro V integra espólio da Biblioteca do Palácio de Mafra”


O Palácio Nacional de Mafra passa a ter nas suas coleções um importante livro oferecido pelo imperador Napoleão III ao rei D. Pedro V (1837-1861). Trata-se da obra “L’imitation de Jésus-Christ: texte latin / suivi de la traduction de P. Corneille”, da autoria de Tomás de Kempis, impressa em Paris pela Imprimerie Impériale [1855], com 872 páginas.

“Esta é uma das obras literárias mais relevantes para a cultura europeia da Idade Média, numa edição especial impressa por ocasião da primeira Exposição Universal de Paris” diz uma nota do Palácio Nacional de Mafra. Pertenceu a D. Pedro V, tendo permanecido em posse dos sucessivos monarcas portugueses até D. Manuel II.

Na página da leiloeira Cabral Moncada, de Lisboa, o livro aparece como tendo sido retirado de um leilão do começo de junho e vendido após o mesmo, onde surgia com uma base de licitação de 3.000 euros.

A publicação tem uma encadernação imperial em marroquim verde, decorada a ouro com ferros a balancé e, ao centro de ambos os planos, sobre um círculo dourado, contém uma placa de prata com as armas de Napoleão III. Numa das páginas registar-se “offert par l’Empereur des Français a Sa Majesté D. Pedro V, Roi du Portugal e des Algarves”.

O volume apresenta o n.º 28200, o eventual registo de entrada na Biblioteca Real, e ainda o carimbo com o monograma coroado DC (de Carlos I) e um símbolo de Manuel II, último rei de Portugal.

Datado do século XVIII, o Palácio Nacional de Mafra, mandado construir por João V, com a riqueza resultante do ouro vindo do Brasil, é um dos mais importantes monumentos representativos do barroco em Portugal.

Foi adquirido através da leiloeira Cabral Moncada, por proposta da Direção do Palácio Nacional de Mafra, justificada “pela sua raridade, proveniência, valor testemunhal e histórico”. Será agora depositada na Biblioteca do Palácio Nacional de Mafra destinando-se, futuramente, a “valorizar o discurso expositivo relativo à personalidade de D. Pedro V, que se encontra estreitamente ligado à história do próprio edifício”.

Fonte: Luso Jornal (França)

“Além-fronteiras: Festival de arte contemporânea Sète-Lisboa vai cruzar artistas portugueses e franceses”


Um Festival Internacional de Arte contemporânea que vai estabelecer um intercâmbio entre artistas portugueses e franceses terá lugar em setembro e outubro deste ano nas cidades de Sète e Lisboa, unindo a cultura ao turismo.

Esta Bienal Internacional de Arte Contemporânea teve início em 2019, fruto de uma ideia nascida à mesa de um café entre três amigas, que iniciaram o projeto com uma colaboração entre a cidade de Sète e Los Angeles, razão por que ficou com o nome de Festival SLA.

As três fundadoras – Sophie Dulin, Pauline Boyé e Marie Taillan – levaram depois, em 2022, o festival até Palermo, e este ano chega a vez da cidade de Lisboa, para apresentar o melhor da criação artística francesa ao público português e vice-versa, numa colaboração entre artistas dos dois países que se espera lance raízes para futuras parcerias, disse Dominique Depriester, Diretora do Instituto Français du Portugal, em conferência de imprensa.

Segundo a responsável, este festival é um prolongamento da temporada cruzada Portugal-França, que decorreu em 2022, e contará com alguns dos artistas que participaram naquele evento.

A escolha da cidade francesa Sète, prende-se não só com o seu enorme património marítimo, mas com os imensos artistas – estima-se que cerca de 400 -, entre os quais Agnès Varda e Paul Valery, que escolheram a região para viver e desenvolver o seu trabalho nas mais diversas áreas, desde o teatro à dança, passando pela música, explicou Tiphaine Collet, Diretora do Gabinete de turismo intercomunitário.

 

“O SLA pretende dar voz a esta multiculturalidade artística”, salientou

 

Sète tem quatro museus e organiza mais de 15 festivais nacionais e internacionais, sendo nesta cidade que artistas portugueses vão ter oportunidade de trabalhar e fazer residências entre os dias 09 e 14 de setembro.

Pedro Barateiro, Inês Barros, Sara Bichão, Pedro Cabrita Reis, Vasco Costa, Manuela Marques, Felipe Oliveira Baptista e Márcio Vilela são os artistas portugueses que estarão a trabalhar com entidades artísticas de Sète naquele período.

De 15 a 19 de outubro será a vez de Lisboa abrir portas aos artistas franceses, acolhendo-os em atividades no Convento dos Capuchos, na Casa do Comum, na Galeria Rui Freire, na Ojo Gallery e na Galeria Salto, revelou uma das fundadoras do SLA, Marie Taillan.

Outros locais do festival em Lisboa vão ser os jardins da Fundação Calouste Gulbenkian e o Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia (MAAT).

No que respeita a residências, está previsto os artistas franceses Damien Fragnon e Agnès Fornells fazerem residências na Junqueira Residency e na Galeria Homa, respetivamente, enquanto Sara Bichão, Inês Barros e Julien Fargetton (que nasceu em Lyon mas vive em Lisboa) farão residências artísticas em Sète.

Segundo as fundadoras deste projeto, a razão de escolha de Lisboa para a edição deste ano do festival deve-se ao facto de esta cidade “ter uma energia criativa semelhante” à de Sète, ao programa de encontros possíveis, e à “generosidade dos habitantes, dos artistas e dos atores culturais”.

Sophie Dulin especificou que este é um festival multidisciplinar, que une artes visuais, performance, música, cinema, artes digitais, artes plásticas, escultura, instalações, entre outras, e que pretende reunir pessoas, conhecer e descobrir novas formas de trabalhar e misturar práticas e culturas artísticas.

Cada edição do Festival de Arte Contemporânea SLA tem um projeto prévio que reúne todos os artistas e que, neste caso, consistiu numa edição limitada de serigrafias, reunidas numa caixa, disse Pauline Boyé, outra das fundadoras da associação que dirige o certame.

“Resulta do diálogo entre os diferentes artistas. É um enorme trabalho que contempla a visão de conjunto de todas as obras e de todos os artistas e que, no fundo, são o coração do festival”, afirmou, adiantando que esta caixa “reúne algumas obras originais”.

Esta edição limitada de 100 caixas, concebida um ano antes do festival, tem como objetivo não apenas começar a estabelecer ligações entre os artistas e o curador do festival, Philippe Saulle, mas também despertar o interesse, comunicar e sobretudo obter o apoio de mecenas, que comprem este conjunto.

“Da venda, resultam os fundos que necessitamos para as residências e para o intercâmbio de artistas”, explicou Pauline Boyé.

Os promotores descrevem o festival como uma aventura artística não convencional, uma aventura humana de amizade, um ponto de encontro gratuito e aberto aos artistas, e uma oferta de arte contemporânea única para todos.

Além das três fundadoras e do curador, o projeto SLA conta ainda com dois cenógrafos, Mr&Mr (Alexis Lauthier e Pierre Talagrand), dois técnicos, Maël Mignot e Gregory Cadet, e 20 voluntários.

Fonte: Luso Jornal (França)

“Além-fronteiras: II Guerra Mundial: Homenagem aos três portugueses deportados no Train de Loos”


Por: Carlos Pereira

No dia 1 de setembro de 1944, 866 prisioneiros da prisão de Loos, na área metropolitana de Lille, foram ‘carregados’ naquele que viria a ser o último comboio de deportados durante a II Guerra mundial, em direção aos campos de concentração na Alemanha. No domingo passado tiveram lugar as cerimónias de evocação dos 80 anos deste funesto comboio que também levou a bordo três portugueses: Henri de Moraes, Jean Póvoa e Benoit da Costa Araújo.

A cerimónia teve lugar, como habitualmente, no cemitério Delory, junto ao monumento onde estão inscritos os nomes dos prisioneiros que seguiram no comboio, com intervenções de Grégory Celerse, Presidente da Amicale du Train de Loos, de Anne Voituriez, Maire de Loos, e de Bertrand Gaume, Préfet du Nord.


“Na manhã do dia 1 de setembro de 1944 os Nazis decidiram evacuar os prisioneiros da prisão de Loos, que acolhia centenas de detidos de toda a região Pas-de-Calais, de várias nacionalidades diferentes, entre elas um português e dois de origem portuguesa, detidos por atos de resistência, sabotagem, distribuição de folhetos ou pertença a movimentos de resistência. Estavam em prisão preventiva, aguardando julgamento” começou por explicar ao LusoJornal Grégory Celerse. “O avanço das forças aliadas depois do desembarque, sobretudo nesta região, fez com que os alemães tivessem decidido evacuar a prisão para levarem os presos para os campos de concentração na Alemanha”.

A saída do comboio teve lugar numa sexta-feira à noite, e no dia seguinte começaram os combates para a libertação de Lille, que duraram cerca de 48 horas. “Foi por poucas horas, mas efetivamente os Nazis conseguiram fazer partir este comboio” afirma Grégory Celerse.

Este ano estava ainda mais gente a assistir às cerimónias, desde familiares de deportados, aos jovens do Conselho Municipal da Juventude Loossoise. Estavam presentes ainda autarcas da cidade, do Departamento e da Região e o içar da bandeira foi efetuado simbolicamente por Matys, neto do resistente e deportado Antonin Delignières.


Aurore Descamps-Ronsin, bisneta de um soldado português da I Guerra mundial, lá estava com a bandeira da Liga dos Combatentes de Lillers. “Foi a primeira vez que participei nesta cerimónia. Penso que era importante estar aqui porque no comboio de Loos havia franceses, mas também havia franceses um pouco diferentes des outros, porque eram também portugueses” explicou ao LusoJornal.

“Muitas vezes, quando se fala dos Portugueses – e eu estou neste caso – falamos muito da participação na I Guerra mundial, na Batalha de La Lys, nesta primeira parte da história, que é fundamental para compreendermos o resto, mas esquecemos que alguns soldados decidiram ficar em França, casaram com francesas, fizeram aqui as suas vidas, tornaram-se franceses eles próprios – a partir de 1920 houve acordos para facilitar a integração e o acesso à nacionalidade dos trabalhadores estrangeiros – e mesmo se eles nunca renunciaram a Portugal, quando a França foi invadida uma segunda vez, para eles foi insuportável, e tornaram-se nos Resistentes que conhecemos”.

Henri de Moraes e Jean Póvoa eram efetivamente filhos de soldados portugueses que participaram na I Guerra mundial. Os dois morreram em cativeiro e já não regressaram a França. Benoit da Costa Araújo nasceu em Portugal, emigrou para França entre as duas Guerras e conseguiu regressar.

Dos 866 deportados do Train de Loos, regressaram 275. “O que não quer dizer que todos sobreviveram, porque alguns vinham em estado de tal forma fragilizado pelas condições terríveis de detenção, que morrerem nas semanas ou nos meses seguintes” confirmou Grégory Celerse.

Henri de Moraes era um jovem Resistente bastante ativo e tentou mesmo libertar prisioneiros da prisão de Loos. “Os deportados nem sempre ficavam no mesmo campo de concentração e o Henri de Moraes foi levado para um campo e depois para outro e faleceu no caminho entre os dois. O corpo foi atirado do comboio abaixo, um colega dele, que seguia no mesmo comboio, testemunhou” completa António Marrucho, da equipa do LusoJornal no Norte da França. Henri de Moraes morava em Lambersart e a cidade decidiu dar o nome dele a uma das ruas.

Jean Póvoa tem também a particularidade de ter morrido na Alemanha, no dia seguinte ao da libertação do campo onde estava detido.

Benoit da Costa Araújo regressou a França e viveu até 2002. “Ele regressou à vida de mineiro. Pelo facto de ser mineiro e de ter sofrido durante a deportação, aos 41 anos foi dado como inválido, mesmo se só morreu muitos anos depois” completa António Marrucho.

“Estes três fazem parte dos portugueses que estiveram implicados na Resistência, mas nesta região há muitos mais, nomeadamente dois que foram fuzilados em Arras: o José Santos e o Albert de Lima”, acrescenta.

Para a Maire de Loos, “esta comemoração é importante porque aqueles que viveram este passado dramático e injusto, vão desaparecendo, vão morrendo, e quando todos os sobreviventes tiverem desaparecido, se não tivermos organizado o trabalho de História e de Memória, 30, 40, 100 anos mais tarde podemos ter esquecido tudo o que se passou, ou então, algumas pessoas mal intencionadas podem tentar apagar, dizer que tal nunca existiu, que não teve esta importância, que apenas diz respeito a poucas pessoas” disse ao LusoJornal.

“Se não nos lembrarmos disto, as coisas podem repetir-se mecanicamente. As mesmas causas produzem os mesmos efeitos e para evitar isso, temos de explicar a barbárie e temos de explicar que um país, para se desenvolver, não é necessário, nem indispensável invadir os outros países” diz Anne Voituriez.

Entrevistada pelo LusoJornal, a Maire de Loos explica que “já no ano passado encontrei aqui portugueses nestas cerimónias. Estou sensível que Portugal se junte às nossas comemorações, à nossa história comum. Estou contente que, para além das fronteiras, os valores da liberdade e dos princípios democráticos possam encontrar-se numa cerimónia memorial deste tipo”.

Fonte: Luso Jornal (França)