sábado, 20 de dezembro de 2025

“Investigador do Instituto Superior Técnico da ULisboa distinguido com bolsa ERC para estudar a origem evolutiva da endotermia na linhagem dinossauros-aves”


Projeto DAEDALUS, liderado por Ricardo Araújo, propõe metodologia baseada no ouvido interno para estimar temperaturas corporais em espécies extintas

 

Ricardo Araújo, docente do Instituto Superior Técnico da ULisboa e investigador no Centro de Recursos Naturais e Ambiente (CERENA), foi distinguido com uma bolsa do European Research Council (ERC). O financiamento, no valor de 2 milhões de euros, permitirá avançar com o Projeto DAEDALUS, uma proposta que procura determinar quando surgiu a endotermia - a capacidade de manter uma temperatura corporal estável - na linhagem que liga os dinossauros às aves.

O projeto recorre ao índice de termo-motilidade (TMI), uma métrica biofísica que resulta da análise da anatomia dos canais semicirculares do ouvido interno. Estes canais, que desempenham funções no equilíbrio e na perceção do movimento, apresentam características cuja relação com a temperatura corporal pode ser quantificada. “O TMI permitirá, assim, estimar temperaturas corporais em espécies extintas a partir de dados anatómicos presentes nos fósseis”, explica Ricardo Araújo. A hipótese central do projeto aponta para o surgimento da endotermia durante o Triásico.

Para validar o TMI, a equipa terá de suprir limitações de dados “críticas”. “Atualmente, existem dados de viscosidade para apenas uma espécie de ave (o pombo) e nenhum réptil”, aponta. Entre estas está o registo sistemático dos movimentos reais da cabeça de tetrápodes modernos, permitindo aferir a precisão dos modelos biomecânicos utilizados. O projeto inclui ainda o estudo da relação de escala entre o labirinto ósseo e o labirinto membranoso em diferentes grupos de vertebrados, de modo a aprofundar o conhecimento sobre os tecidos moles do ouvido interno.

“Tentar determinar a temperatura de um dinossauro apenas com fósseis é como tentar adivinhar a velocidade máxima de um carro antigo apenas olhando para a sua carcaça ferrugenta. O Project DAEDALUS propõe-se a reconstruir o motor (anatomia interna), analisar o combustível (viscosidade da endolinfa) e ver como o carro se comportava na estrada (movimento da cabeça) para saber quão “quente” o motor realmente corria”, enquadra Ricardo Araújo.

A componente laboratorial será reforçada pelo “desenvolvimento de protocolos cirúrgicos específicos e pela construção de um nanoviscosímetro, instrumento destinado a medir a viscosidade da endolinfa” (fluido existente nos canais semicirculares e cuja composição influencia diretamente os cálculos associados ao índice). Em complemento aos estudos experimentais e de modelação, está prevista a realização de trabalho de campo em formações do Triásico, com o “objetivo de recolher fósseis de grupos basais de dinossauros considerados fundamentais para testar as hipóteses evolutivas em investigação”, destaca Ricardo Araújo.

À equipa vão juntar-se também otorrinolaringologistas, veterinários, biólogos, e engenheiros, estando previstas mais escavações em Portugal e em Moçambique. “O projeto DAEDALUS não estará apenas a tentar ler um mapa antigo (os fósseis); estará a construir uma “lente” inteiramente nova (com um nanoviscosímetro e recorrendo a algoritmos de IA) que permitirá à comunidade científica ver detalhes fisiológicos que, até agora, eram invisíveis a olho nu”, defende o investigador.

A atribuição da bolsa ERC posiciona o Instituto Superior Técnico da ULisboa “na vanguarda da biologia evolutiva e paleobiologia mundial, transformando-a num polo central de inovação tecnológica aplicada à ciência fundamental”, conclui o investigador, convertendo-o num “centro de engenharia, onde as ferramentas para descodificar a fisiologia do passado são inventadas e validadas para o mundo inteiro”.

Fonte: Instituto Superior Técnico da Universidade de Lisboa

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